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A associação do idealismo à ascensão da burguesia ao poder – e à consolidação da formação social e econômica capitalista – é muito comum. Não é incorreto, mas também não é toda a realidade, pelo menos na perspectiva histórica da Inglaterra.

Com efeito, correntes materialistas do séc. XVII também foram importantes para o capitalismo nascente, na medida que fundamentaram as ciências experimentais e os avanços tecnológicos, sem os quais não haveria uma Revolução Industrial no século seguinte.

Karl Marx (e Friedrich Engels), indiscutivelmente um filósofo materialista, considerou Francis Bacon (1561-1626) o pai do materialismo inglês (e das ciências experimentais dos tempos modernos). Thomas Hobbes (1588-1679) foi o continuador do materialismo de Bacon.

Pode-se afirmar que Hobbes, autor do Leviatã, foi uma materialista mais radical que Bacon, inadmitindo a existência de quaisquer substâncias imateriais (saber inato, deuses, alma, etc), o que significou a rejeição completa, dentro da filosofia, da escolástica e das concepções teológicas.

Tem-se, assim, a tentativa de abandono da metafísica – que buscava a “essência do ser” dentro de conceitos de imutabilidade -, substituída pela investigação das causas e propriedades das coisas (tudo aquilo que é corpóreo, que tem existência material), consideradas em seu movimento.

Para a dupla em questão, o proveito e o bem estar do homem é o objetivo da filosofia (assim, rejeitando a mera função especulativa), esta última uma disciplina dos corpos (da matéria), sejam eles naturais (criados segundo regras da natureza) ou artificiais (criados pelo homem, como por exemplo o Estado). Para Bacon e Hobbes, no ambiente em que não existem corpos reais, não há sentido algum em filosofar.

No campo da teoria do conhecimento, o materialismo inglês, em oposição à escola racionalista, recusa o saber inato, que despreza os sentidos, afirmando que só se conhece aquilo que é percebido pelos sentidos e pela experiência. Por isso, esse materialismo foi nomeado de empirismo.

A Inglaterra de Bacon e Hobbes, meados do século XVII, estava num processo de transição da formação social e econômica feudal para a capitalista. Burguesia e a nobreza aburguesada, aliadas, buscavam a consolidação como classes governantes, de modo que confrontavam o poder real, a nobreza feudal e a igreja (clero).  

Nesse contexto, o materialismo dos dois filósofos serviu para robustecer, no campo ideológico/simbólico, a nova estrutura econômica que se erguia (obra completada por pensadores do séc. XVIII, como Locke e Hume).

3 comentários sobre “O materialismo inglês e o capitalismo

  1. Paulo Joel Bender Leal disse:

    Amigo, seu texto tem informações importantes, digna de uma pessoa culta como és, mas trata de vários temas complexos ao mesmo tempo. Então, para polemizar, que é ótimo nesta seara, quero divergir sobre uma questão fundamental. Marx e Engels não são filósofos. São pensadores. O papel da filosofia é de pôr a si, a metafísica e as ciências em ordem no âmbito do espírito humano. Abraços e escreva mais sobre o empirismo. Esse tema é relevante, pelo menos Hume me ajudou muito a entender o dilema que o pensamento filosófico de sua época. Tenho para mim que as duas primeiras páginas do suas “investigações acerca do entendimento humano” são reveladoras do drama que a filosofia e a educação enfrentam hoje. Abraços

    ps. tentei postar, mas o site exige cadastramento

    *Paulo JB Leal* Fone: (55) 3312.4207 *Lattes:* http://lattes.cnpq.br/4301054691654039 *Marques do Herval, 1637 – sala 05 * *Santo Ângelo** – 98.801-640*

    Em ter., 14 de abr. de 2020 às 18:33, Blog do Baka escreveu:

    > Charles Bakalarczyk posted: ” A associação do idealismo à ascensão da > burguesia ao poder – e à consolidação da formação social e econômica > capitalista – é muito comum. Não é incorreto, mas também não é toda a > realidade, pelo menos na perspectiva histórica da Inglaterra. Com ef” >

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