
Num grupo virtual de discussão política, Maria Bettanin lembrou que ontem foi o aniversário de morte do Getúlio Vargas (24AGO1954). E conclamou fosse escrito algo sobre o estadista nascido em São Borja (RS)
Como ninguém se aventurou, aceitei a missão. Mas só para fazer algumas considerações gerais, lincando o primeiro governo de Getúlio (fases do Provisório, do Constitucionalista e do Estado Novo) com os dias de hoje.
Indiscutivelmente, Getúlio teve papel importante para a consolidação do capitalismo no Brasil, trazendo desenvolvimento econômico e social.
Calma, pessoal, não estou idealizando a formação capitalista. Não capitulei!
Ocorre que a estrutura econômica brasileira, naqueles idos, tinha um pé fincado no feudalismo – e até no escravagismo.
A República Velha, que sucedeu o Império, foi dominada, principalmente, pelos interesses das oligarquias cafeeiras, de base regional. A economia brasileira dependia basicamente da exportação de produtos com baixo valor agregado (commodities agrícolas), vendidos ao exterior sem nenhum ou com baixo processamento.
Portanto, não havia nenhuma preocupação com o mercado externo, com as bocas e estômagos dos brasileiros.
As oligarquias não pensavam o desenvolvimento do Brasil (industrialização, urbanização, acesso à educação etc). Não havia uma meta de gerar empregos e renda. O empenho das elites era para o enriquecimento próprio. (Estou falando de 1930 ou de 2021?)
Toda ação governamental no campo da economia, como a emissão de papel-moeda – que acabava gerando inflação e aumento da dívida pública -, girava em torno dos interesses das oligarquias regionais.
Foi-se o Império, veio a República (um golpe militar). Mas a economia era essencialmente a mesma.
Por isso, os historiadores afirmam que antes do Estado Novo de Getúlio, não havia um projeto de nação.
As elites, por assim dizer, atrasavam o capitalismo.
Não há capitalismo sem industrialização. Tem de ter a fábrica, o assalariado e a mais valia.
Os avanços da legislação trabalhista promovidos por Getúlio, por exemplo, ocorrem dentro desse contexto de azeitamento das relações capitalistas (capital e trabalho), acoplado a um projeto nacional-desenvolvimentista. Vale lembrar que Getúlio foi formado no berço do positivismo castilhista.
Então, foi um “passo adiante”!
Falei das flores, agora vou falar dos espinhos, fazendo uma rápida ligação com o momento político atual.
Todos acompanham a escalada golpista e autoritária do Bolsonaro. Diante de uma provável derrota eleitoral, o bolsonarismo passa a fortalecer teorias conspiratórias, questionando previamente o processo eleitoral e elegendo inimigos fantasmagóricos.
Um dos inimigos imaginários é o comunismo. Funcionou em 1964, mobilizou as Forças Armadas, as elites e a classe média.
Mas não é de agora, nem de 64, que as Forças Armadas travam uma batalha imaginária contra o “fantasma do comunismo”. E não é só a extrema-direita que usa a bandeira da “ameaça vermelha” para chegar ou manter-se no poder.
Em 1922, foi criado o Partido Comunista Brasileiro. Em 1935, com o propósito de combater o fascismo, os comunistas brasileiros organizaram a Aliança Nacional Libertadora (ALN). Na Europa, quem estavam enfrentado os fascistas eram exatamente os comunistas.
Útil lembrar que no Brasil havia um núcleo fascista, representado pela Ação Integralista Brasileira, liderada por Plínio Salgado.
Pois o Getúlio, diante da “ameaça comunista”, declarou ilegal a ANL. Como resposta, o movimento, chefiado por Prestes, deflagrou um lavante contra o governo de Getúlio, a Intentona Comunista, facilmente derrotada pelas Forças Armadas. Isso em 1935.
Olga Benário e Elisa Berger, militantes comunistas, foram entregues a Gestapo, a polícia nazista. Outros militantes de esquerda foram presos e torturados.
Em 1937, ano pré-eleitoral, os integralistas de Plínio Salgado criaram uma fake news. Forjaram o Plano Cohen, segundo o qual os comunistas planejavam tomar o poder, com apoio da Internacional Comunista e da União Soviética.
Tudo era uma grande mentira, com o objetivo que de criar instabilidade política, conforme foi revelado em 1945 pelo General Góis Monteiro!
A “ameaça comunista” foi a deixa para Getúlio. Em setembro de 1937, o governo divulgou na mídia o Plano Cohen. Em novembro daquele ano, com o apoio das Forças Armadas (que sabiam da farsa) e da classe média, Getúlio derrubou a Constituição de 1934 e impôs a ditadura do Estado Novo. Um autogolpe justificado na ameça comunista.
Aliás, Plínio “armou e se deu mal”. O fascista sabia do plano de Getúlio, esse sim verdadeiro, de frustrar as eleições de 1938. Plínio apoiou o golpe do Estado Novo, na expectativa de assumir o Ministério da Educação no novo governo e fincar as bases do integralismo na estrutura governamental.
Vã esperança, Getúlio dissolveu a Ação Integralista Brasileira (na verdade, todos os partidos políticos foram extintos). Os integralistas tentaram derrubar o Governo Vargas, Plínio foi preso e exilando em Portugal.
Mas se faça justiça: antes Getúlio do que o fascista Plínio, não é mesmo?
E há quem diga que se Getúlio não desse o autogolpe, as Forças Armadas fariam o seu próprio golpe – e contra Getúlio.
P.S.: Texto sem correção. Deixo essa tarefa para os leitores, por favor!