Muitas vezes se sabe o que a elite pensa do país – e de si mesma – pelo que seus ilustres representantes falam lá fora.
Há aproximadamente um ano, personalidades do pensamento brasileiro foram expor em Londres os “vícios do Brasil”, na 2ª edição do Brazil Forum.
Como exceção à visão conservadora, tivemos um Fernando Haddad informando que os investimentos com educação subiram de 3,5% do PIB em 2000 para 5,5% em 2015, sendo que esse acréscimo foi quase todo direcionado para a educação básica, o que foi um significativo avanço no período.
Afora Haddad, o que se viu foi um desfile do “Temer tem razão”. Palestrantes empenhados em demonstrar que as reformas propostas pelo governo golpista são necessárias e trarão benefícios.
Em suma, os porta-vozes da burguesia nacional assumiram no evento o golpe. E deforma forma desavergonhada.
A reforma trabalhista foi aprovada em AGO2017, mas já ali no Brazil Forum sua defesa apaixonada foi feita. Um teatro!
Cláudia Sender, CEO da TAM, por exemplo, afirmou sem qualquer demonstração cientifica que o desemprego no Brasil é culpa da legislação trabalhista. A desconstrução da CLT foi aprovada, tal qual deseja Sender, mas o desemprego só aumentou!
Aliás, esse é o pensamento mágico dos capitalistas em geral: em tempos de crise, maximizar lucros com a redução da massa salarial. Para a burguesia, a economia é algo que existe para se servirem, cabendo aos governos produzir remédios para curá-la quando doente, sempre à custa do mundo do trabalho. E a CLT – e a Justiça do Trabalho, seu guardião – são obstáculos concretos que devem ser removidos. A primeira já foi…
Também falou o senador Armando Pinheiro (PTB), que transformou uma virtude em defeito: nos últimos vinte e cinco anos os “gastos” do governo cresceram 6% ao ano, o que seria um absurdo para economia brasileira. Mas que gastos foram este? Acaso estava o senador se referiu aos investimentos em programas sociais e inclusivos?
Lembro que Armando Monteiro era ministro da presidenta Dilma até o golpe! Ou seja, no mínimo foi cúmplice da suposta mazela que denunciou…
Contudo, o depoimento mais aterrador naquele evento internal partiu de quem se espera prudência e razoabilidade! Pois o min. Luis Roberto Barroso, do STF, jogou fora a bacia de água suja com a criança dentro!
Primeiro, Barroso começou com uma forte carga em desfavor da Justiça do Trabalho, dizendo que 98% dos processos trabalhistas no mundo tramitam no Brasil. Duvido desse dado do Barroso, sua afirmação foi um chute para a lua. É como dizer que no resto do mundo não existem dissensos entre o capital e o mundo trabalho que sejam mediados pelo Poder Judiciário (não existem processos trabalhistas no sentido formal, os litígios são resolvidos no âmbito civil, o que mascara a natureza dos dissensos).
O ministro Barroso seguiu seu esforço pela desconstrução da Justiça do Trabalho dizendo que o Citibank desistiu de operar no Brasil porque era condenado em 93% dos processos trabalhistas! Tomou as dores dos banqueiros e não a dos bancários! Pobres banqueiros endinheirados, supremo ministro!
Lendo as asneiras do min. Barroso, lembrei-me da fala do deputado federal Vítor Lippi (PSDB/SP), discurso na Câmara proferido um mês antes. Disse o parlamentar que 90% das ações trabalhistas no Brasil são baseadas em fraudes. Falou com convicção, mas não apresentou provas. Em nota, a Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo (AATSP) afirmou que a denúncia de Lippi foi “leviana e infundada”.
O min. Barroso foi raso em sua concepção, tal qual o deputado Lippi. Comparou realidades díspares. Ora, não dá para igualar países desenvolvidos com o Brasil, são sistemas judiciais diferentes e com relações de trabalho sem comparação. Os países de primeiro mundo, em sua maioria, estão mais adiantados no que respeita a políticas inclusivas e de bem-estar social, sendo que a remuneração pelo trabalho praticado é mais respeitada.
Qual a realidade brasileira, ignorada pelo min. Barroso? Ora, o Brasil tem um governo que recorre ao Poder Judiciário para impedir que se torne pública a lista das empresas condenadas por trabalho escravo. Temos trabalho escravo no Brasil em pleno século 21 – e isso não é culpa da Justiça do Trabalho, min. Barroso! E muito menos dos trabalhadores escravizados!
A Justiça do Trabalho, cumprindo sua missão constitucional, tem prestado relevantes serviços aos brasileiros, dentro dos limites do sistema. Esta Justiça Especializada não condena empresas ou dá mais dinheiro ou direitos que o empregado efetivamente mereça, mas aplica a lei, garantindo os direitos dos trabalhadores (e também dos empregadores).
Ora, se há grande número de processos trabalhistas, não ocorreu ao min. Barroso que isso de deve à cultura de desrespeito aos direitos trabalhistas e aos valores do trabalho, protegidos pela Constituição que ele, como integrante do STF, tem a obrigação de resguardar.
Mas o ataque feroz do ministro Barroso ao mundo do trabalho não parou aí. Mais parecendo um líder de governo do que um magistrado do STF, Barroso ainda investiu na defesa da reforma previdenciária.
Disse Barroso, para o mundo todo ouvir:
– Quando vejo um pobre ser contra a reforma da previdência, tenho pena. Ele esta sendo enganado.
Assim, para mim não foi nenhuma surpresa Barroso ter votado agora no último dia 10MAI pela constitucionalidade da reforma trabalhista. Ou seja, bateou o escanteio e apareceu na área para cabecear!
Barroso justificou seu voto dizendo que a “proteção fora da justa medida, desprotege, além de infantilizar indivíduos que precisam ser autônomos”. Em que mundo vive?
O min. Barroso ainda filosofou no seu voto:
“Portanto, este não é um debate entre direita e esquerda, e sim sobre o que é melhor para os trabalhadores, para a sociedade e para o país”.
Pois eu tenho pena do Brasil por ter um magistrado tão desligado do mundo do trabalho e da sua crueza!
Barroso e Temer saíram vitoriosos na reforma trabalhista. É inegável.
Pois espero que o povo resista e impeça a reforma previdenciária e a destruição da Justiça do Trabalho. São os próximos objetivos dos golpistas.
Claro que Lula preso, tudo fica mais fácil para os canalhas!