
No Reflexões à Esquerda, a partir de uma postagem do professor e historiador Luís Henrique Prado de Santis (para acessar a página, clique aqui), toma corpo um interessante debate sobre as transformações pelas quais passa o mundo do trabalho.
Pois a discussão, dentro de sua dinâmica, foi se espraiado em vários subtemas, um deles levantado pelo Fagner Garcia Vicente, a questão da identidade e das lutas indentitárias.
Vou desembridar o debate para cá no bloguinho, abordando a questão da identidade.
Certa feita, o meu querido amigo e mestre Flavio Bettanin fez uma observação. Disse Bettanin: “a lógica metafísica evidentemente tem seus limites porque ela nega o movimento real, que é contraditório e que traz nessa contradição as sementes da mudança, mas não significa que ela não seja útil para o entendimento das coisas, especialmente o desenvolvimento de um discurso lógico, desde que saibamos das suas restrições”.
Por certo não externou sua posição exatamente com estas palavras, aí é pedir demais da minha memória. Aliás, Bettanin certamente reforçará a sua contribuição nas próximas intervenções, dizendo mais sobre a assertiva que lhe atribui a autoria, inclusive para me desmentir, se for o caso.
Pelo princípio de identidade, segundo a metafísica, tem-se que uma proposição é sempre igual a ela mesma, nunca diferente, uma paridade absoluta. Isso implica na imutabilidade da proposição. Desse princípio decorrem outros dois: o da não contradição (algo não é falso e verdadeiro ao mesmo tempo) e do terceiro excluído (uma afirmação ou é verdadeira, ou é falsa, não há uma terceira opção). Como disse Parmênides, “o ser é, o não-ser não é”.
Levando estes princípios para o “movimento real”, sem qualquer mediação, significaria admitir que as coisas no mundo tem uma identidade específica (A é A), sem contradição (A não é B) e que não sofrem mutações (A não será B) – inclusive o próprio movimento não é efetivo, mas só aparência, um resultado da “ideia”. Ora, dentro de uma concepção dialética (e histórica) tais construções metafísicas são contrafactuais, visto que há movimento, há contradição, há mudança e há um devir. Lembrando Heráclito: “tudo flui e nada permanece, (…) o mundo é um eterno devir”.
Mas isso quer dizer que não se pode encontrar uma “identidade” nas coisas e no próprio movimento? A é A e não é B na “fotografia” do momento, embora mais adiante possa ser B? Quando defino o que é a dialética, por exemplo, não estou atribuindo uma identidade para a coisa (um significado para o significante)? Quando conceituo classe proletária, não estou atribuindo a ela uma identidade? Claro que esta “identidade” não tem aquele limite metafísico da imutabilidade (A será sempre A), a classe proletária de ontem não é a mesma da de hoje, nem a de hoje será idêntica à classe proletária num futuro mais distante – e nem sempre ela existirá.
Uma mudança possível dentro da identidade de classe, por exemplo, ocorre quando ela toma consciência de sua situação dentro do “movimento real”, assumindo a identidade de “classe para si”. Assim, nesse aspecto, entender sua “identidade” de classe (que também implica. de certo modo, alterar a identidade anterior), não como uma identidade metafísica, imutável, não contraditória, faz parte do processo de tomada de consciência existencial, política e, principalmente, material.
Assim, a luta da classe proletária (da classe trabalhadora, da classe assalariada, da classe que pelo seu trabalho “valoriza” o Capital ou contribui “externamente” para a valorização Capital – falo aqui do trabalho improdutivo), enquanto movimento, também é, em certo sentido, uma luta identitária e anticapitalista.
Talvez seja um equívoco do pensamento materialista negar-se a investigar as questões ontológicas que se apresentam, omissão que decorre do receio de ser confundido com a cepa metafísica.
(Texto sem correção ortográfica, que fica a cargo do leitor)