
Como pontapé inicial da Guerra Fria entre os EUA e a antiga URSS/bloco socialista, foi estabelecida a Doutrina Truman, do presidente norte-americano Harry Truman (1945), política externa anti-soviética agressiva, que dava a linha ideológica aos países do bloco capitalista para o combate ao “socialismo real”. Foi o início de um período de bipolarização político-ideológica mundial e resultou em pelo menos dois graves conflitos, a Guerra da Coréia (1950) e a Guerra do Vietnã (1964).
Uma das primeiras iniciativas para a implantação da Doutrina Truman foi o plano Marshall, que consistiu na abertura de linhas de crédito para a reconstrução da Europa, destruída pela Segunda Grande Guerra. Só recebia a grana quem se opusesse ao regime soviético.
Pelos idos de 1950, o Senador republicano Joseph McCarthy,
no contexto da Guerra Fria, passou a desenvolver forte patrulha anticomunista, que logo foi adotada pelo Governo norte-americano e pelos proprietários dos meios de produção. O “movimento” foi batizado de macartismo, em referência ao senador idealizador.
O objetivo do macartismo era a repressão e perseguição política de pessoas do campo progressista, mediante o emprego de métodos de censura e difamação. Quem não tinha alinhamento ideológico com o conservadorismo e com a formação social e econômica capitalista, era acusado de traição ou subversão, ainda que sem evidências.
No macartismo, as acusações de comunismo tomaram tamanho. Os aparelhos de repressão do Estado e as próprias empresas privadas abriam inquéritos para investigar “subversivos”. Os alvos favoritos para o constrangimento: professores, sindicalistas, servidores públicos e trabalhadores da indústria do entretenimento.
Pessoas ilustres foram perseguidas nos EUA pelo histerismo macartista. Uma delas foi o grande Albert Einstein. O chefe do FBI, Edgar Hoover, tentou desencadear um processo para expulsar dos Estados Unidos o autor da teoria da relatividade, acusando-o de espionagem para os soviéticos, um verdadeiro absurdo! Sobre a perseguição a Einstein, acesse clicando aqui.
Já escrevi em outras oportunidades, inclusive aqui no bloguinho, que a Escola Sem Partido é uma macartismo à moda brasileira. Ele tem uma particularidade: além de perseguir comunistas, também apresenta uma nuance, o obscurantismo, já que não se persegue tão somente o pensamento progressista, mas o próprio conhecimento científico, acusado de perverter valores familiares e religiosos.
Leio agora que a desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, decidiu permitir que a deputada eleita Ana Caroline Campagnolo, do PSL, veicule em rede social postagem para estimular denúncias de alunos em desfavor de professores que, em sala de aula, supostamente façam propaganda político-partidária ou que expressem conteúdos ideológicas (acesse a matéria clicando aqui).
Ora, trata-se da institucionalização e naturalização de uma espécie de macartismo tupiniquim, abrindo espaço para denúncias vazias e desconstrução de educadores. Uma lástima!
Claro que nenhum professor deve utilizar a sala de aula para fazer proselitismo partidário. Mas não se tem notícia que esse seja uma prática dos nossos educadores, salvo raríssimas exceções, situações que podem ser controladas pela comunidade escolar ou pelos canais oficiais, mas sem histerismo e caça às bruxas.
Agora, não há como proibir os professores de abordar temas que contenham carga ideológica e política. Nem é desejável. Como lecionar História, por exemplo, sem dizer o que os sujeitos históricos pensavam e como agiram? Para não melindrar alguns generais, os professores tem de omitir as práticas de tortura e assassinato desenvolvidas na ditadura civil-militar de 1964? Mas se assim o fizerem, não estarão agindo ideologicamente, no sentido negativo do termo (fraudando os fatos históricos)?
Certamente que o professor não pode “doutrinar” (no sentido de impor ao aluno uma linha de pensamento político-ideológico). Contudo, não há como o educar propor uma discussão em sala de aula (produção de conhecimento na relação de aprendizagem alunos-professor) sem dizer o que pensa. O professor, em qualquer disciplina de humanas, vai permitir o contraditório, mas não tem como fazê-lo sem apresentar a tese, porque é assim que se abre espaço para a antítese e síntese (dialética básica), para a pesquisa e espírito de investigação científica.
Indago: é possível que existam pessoas sem ideologia, esta entendida como forma de consciência social (ideologia em sentido estrito, quando a forma de consciência quer conservar o status quo – o discurso do dominador -, e utopia, quando quer modificá-lo – a visão de mundo do dominado que almeja romper grilhões)? Não! Todo humano possui uma consciência social, ainda que falsa ou com percepção distorcida da realidade!!
Ora, a própria desembargadora, ao proferir sua decisão, expressou uma linha ideológica (e não poderia ser diferente)!
Não querem ideologia? Então, removam o cérebro dos professores e dos alunos! Proíbam a reflexão, o senso crítico e a pesquisa! Obriguem os alunos a reproduzir as velhas ideias dominantes. No futuro, serão dóceis “colaboradores” de um sistema de concentração de renda e riquezas, de profundas desigualdades e de ausência de liberdade.